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Cadeiras, mesas, telhas e tijolos: fragmentos de uma imagem-paisagem em suspensão

Em sua primeira exposição na Janaina Torres Galeria, David Magila apresenta trabalhos inéditos em pintura e escultura que o apontam como um dos artistas mais promissores de sua geração. Formado em artes visuais, Magila possui um conhecimento técnica que propiciou que se dedicasse, por um bom tempo, à comunicação visual. Sua produção atual transparece o domínio conquistado com essa experiência, que agora é colocada a serviço do amadurecimento de uma poética híbrida, na qual desenho, pintura, fotografia e escultura dão vazão a composições ao mesmo tempo despojadas e complexas. Logo, em primeiro lugar, há um caráter afirmativo nessa produção mais recente, que diz respeito à maturidade alcançada.

 

Além do apuro técnico, desde meados dos anos 2010 Magila vem realizando com êxito grandes intervenções em fachadas de edifícios públicos como, por exemplo, os projetos de pintura mural “Arquitransitoriedade” (SESI, São José dos Campos, SP, 2017) e “Terra Parque dos Estados” (Festival de Inverno de Bragança Paulista, 2016). O trabalho com grandes superfícies de dimensão pública acaba transparecendo nas telas atuais, nas quais as composições baseadas em fragmentos do espaço urbano se apresentam sem titubear ao observador. Sua comunicação é direta, feita por meio de formas bem definidas e cores chapadas, numa estética próxima aos grafites gigantes espalhados pelas grandes cidades.

No entanto, no espaço restrito da tela, essas composições provocam uma espécie de vertigem, na medida em que colocam o observador diante da multiplicidade simultânea de acontecimentos que nem sempre são de fácil apreensão quando experimentados sem a rapidez da vivência urbana. Aos poucos o olho parece se acostumar, ou ao menos encontra um caminho aparentemente seguro na paisagem, quando começa a reconhecer fragmentos do espaço: cadeiras, mesas, tijolos, carrinhos de construção, telhas, caixotes, entre outros. Essas figuras, como “dispositivos de reconhecimento”, são realizadas por um desenho bem delineado e em cores chapadas, a partir de fotografias que o artista realiza em andanças pela cidade.

Mas um certo conforto que poderiam assegurar, é traído pela composição dissonante das pinturas. David Magila não pretende reconstituir o espaço do mundo como este se apresenta para o olhar prosaico. Ao contrário, está interessado na estranheza dos acontecimentos, nas relações e encontros improváveis camuflados por essas figuras. Neste sentido, as telas constroem, por meio da apropriação de fragmentos, uma nova ordem.

Seria fácil afirmar que Magila trabalha entre a figuração e a abstração, como tantos outros pintores contemporâneos. Mas essa zona intermediária não diria muito sobre a atmosfera dos trabalhos. Há algo em suas pinturas que é, paradoxalmente, gritado e sussurrado. O contraste direto entre zonas brancas e sombras pretas, entre cores fortes artificiais e tons esmaecidos, entre pinceladas escorridas e gestuais e as figuras feitas com máscara e spray, entre a forma reconhecível e o informe, alimentam o incômodo diante da impossibilidade de reconstruir a totalidade das imagens.

 

No caso das esculturas, um campo de experimentação recente para o artista, algo semelhante ocorre. Magila recolhe estruturas abandonadas ou sem uso, achadas ao acaso, e a partir delas produz objetos tridimensionais que remetem tanto ao familiar, quanto ao estranho. Materiais díspares em textura, peso, cor e resistência (silicone, ferro, vidro e acrílico) são reunidos em objetos cuja junção carrega algo de despropositado, apesar de reconhecível.

Mas o foco não deve estar exatamente nessas oposições, que em certa medida são bem claras. O que está em jogo é o fato de que tal clareza não fornece a chave para uma compreensão definitiva. Por isso, o significado não está naquilo que os trabalhos mostram de maneira contundente. Mas antes nas faltas, nos interstícios, no corte perceptivo. David Magila não reconstitui, afinal, uma imagem fechada e completa. Na verdade, o artista parece buscar na suspensão espaço-temporal, nos instantes de ruptura ou descontinuidade, a potência de sua poética.

Taisa Palhares, maio de 2019.

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